No local da queda do PP-SRK, o primeiro sinal da colisão do 727
com o solo estava a aproximadamente 500 metros do local do núcleo dos
destroços. Este sinal era um pedaço da asa do Boeing, medindo cerca de
dois metros, tendo sido o maior pedaço da aeronave encontrado naquele
dia.
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Parte da asa do 727 com parte do prefixo |
Esta parte da asa foi localizada pelo major Emílson, do Corpo de
Bombeiros, que estava na liderança de um grupo de 20 homens, os
primeiros a chegar (oficialmente) ao local da queda do avião.
Segundo
informações destes homens, daquele ponto em diante podiam ser vistos
partes do avião, restos de corpos e peças de vestuário pelo chão e até
mesmo pendurados nas árvores.
Os bombeiros, impressionados, ante a gravidade do acidente, declararam
que dificilmente haveria um único corpo que pudesse ser inteiramente
reconstituído.
Sabe-se que, além do impacto e da explosão, houve um incêndio inflamado
pelos 10.000 litros de combustível que restavam nos tanques do avião,
motivo pelo qual certas partes ainda soltavam fumaça mais de 12 horas
após da tragédia.
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Turbina do PP-SRK, fotografada 6 horas após o acidente |
Ao saber do acidente, muitas pessoas (que se tornaram centenas no dia
seguinte) iniciaram a escalada da Serra da Aratanha, um caminho íngreme
e que foi, depois de algumas horas, interditado.
Três rapazes (José Ribeiro dos Santos, Raimundo Felício Ribeiro e
Francisco Eugênio) foram presos por soldados do Corpo de Bombeiros
carregando maços de cigarros e outros objetos, entre eles um dedo com um
anel de brilhantes. Um dos primeiros membros da FAB a chegar ao local
enviou uma mensagem via rádio para outro e disse "Félix, estamos no
local... Tudo destruído, não há sobreviventes!".
O governador Manoel Castro Filho reuniu seu secretariado e decretou luto
oficial de três dias, enviando diversas unidades da polícia e dos
bombeiros para ajudar no resgate. Logo cedo na manhã da terça-feira já
haviam pessoas trabalhando no local, mas a encosta da Serra da Pacatuba
é extremamente acidentada, cheia de pedras e densamente florestada,
dificultando o acesso.
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Maior pedaço de fuselagem do PP-SRK |
O impacto foi forte o suficiente para lançar destroços e restos mortais
em uma grande extensão de área, alguns a mais de 500 metros.
Helicópteros da FAB sobrevoavam o local, içavam sacos plásticos (alguns
mencionavam sacos de amianto) com corpos e partes humanas recolhidas,
trazendo tudo para o estádio municipal de Pacatuba.
O primeiro helicóptero com material humano chegou as 16h45, quase 14
horas após a queda do 727, levando um saco contendo 50 quilos de restos
mortais dos passageiros.
No total, naquele primeiro dia, mais cinco
viagens foram feitas e o total subiu para 400 quilos de fragmentos
humanos, quase nada perto das dez toneladas que pesavam as 137 pessoas a
bordo.
As arquibancadas estavam lotadas de pessoas que queriam ver de
perto estas cenas e muita gente que acompanhava os trabalhos desmaiava.
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O
resgate era feito prendendo os sacos que levavam os corpos em
helicópteros |
No local do acidente as cenas eram dramáticas e, em alguns casos,
soldados da FAB tinham de ficar pendurados em cordas sob helicópteros
que pairavam sobre as árvores para retirar partes de corpos que estavam
presos nos galhos mais altos.
Os trabalhos no primeiro dia foram interrompidos às 18h00 e uma equipe
de trinta soldados da Aeronáutica ficou de guarda no local para evitar
novos saques.
O piloto de um dos cinco helicópteros acionados para o resgate, capitão
Tothy, arriscou um palpite: uma pane no altímetro do avião havia causado
o acidente, hipótese que também foi aventada no final da tarde pelo
capitão Xavier, membro do Serviço de Segurança da Aeronáutica. A FAB,
neste primeiro dia não encontrou os gravadores de voo, conhecidos
genericamente como "caixa-preta".
Enquanto isso, nesta mesma noite (por volta da 21 horas), o PP-SMV, um
dos 737-200 da Vasp que levava para Fortaleza parentes das vítimas,
passou sobre o local da queda do 727 em sua aproximação para pouso.
Entre os passageiros estavam Ricardo Fernando Paiva e Roger Paiva,
filhos de Fernando Antônio Vieira de Paiva, comandante do PP-SRK.
Ao
refazer a rota da aeronave sinistrada, Paulo Roberto Queiroz, comandante
do 737 disse: "Acabamos de fazer exatamente a mesma rota que deveria ter
sido percorrida pelo Vieira. Não sei como ele chocou-se com aquela
montanha". Esta frase ganhou destaque na cobertura do jornal "O Estado
de São Paulo" do dia seguinte.
Entre terça (data do acidente) e quinta-feira, a FAB trabalhou no local.
Quando finalizou as buscas e liberou a área, vieram os populares,
começando a surgir indícios de que o resgate havia sido falho.
Na sexta-feira, dia 11 de junho, já após a FAB já haver deixado o local,
dois corpos foram encontrados debaixo de uma das turbinas JT8D-17 que
equipava o 727, uma das muitas partes do avião não haviam sido
recolhidas.
O prefeito de Pacatuba, Valter do Carmo Filho, alertado de que o resgate
havia sido incompleto, contratou extra-oficialmente várias pessoas para
continuar as buscas dos ocupantes do Boeing. Foram estas as pessoas que
encontraram estes dois corpos e vários de pedaços de outros que, pelo
pequeno tamanho, foram enterrados lá mesmo.
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Novas buscas por civís e destroços deixados para trás
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A Vasp se preocupava em pedir ao IML da pequena cidade que liberasse
logo os atestados de óbito (nos quais trabalhavam 24 médicos legistas e
3 datiloscopistas). Ao mesmo tempo, na delegacia de polícia do município
as pessoas continuavam a levar documentos, relógios, talões de cheque e
até mesmo pedaços de seres humanos.
Quando os dois corpos foram descobertos embaixo da turbina
(identificados depois como membros da tripulação, pois vestiam calças
azuis e camisas com o emblema da Vasp), o delegado de Pacatuba comunicou
o fato ao Secretário de Segurança do Estado que foi até a cidade e
constatou que havia sido falho o trabalho realizado pela equipe de
resgate da FAB que atuou inicialmente no local.
Mais 25 homens foram
colocados para trabalhar na área e o resultado logo apareceu: mais
quatro corpos (três homens e uma mulher) foram encontrados.
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Corpos aguardando serem transportados pela FAB |
Colocados em sacos, ficaram aguardando que um helicóptero da FAB os
levasse para o IML de Fortaleza. Enquanto estas vítimas eram
transportadas, dezenas de materiais do avião como uma das turbinas (que
ainda soltava fumaça), portas, pneus e rodas, partes das asas e outras
peças inteiras jaziam no local, muitas das quais começavam a ser levadas
como "lembranças" pelas pessoas que visitavam o local.
O Governador do Estado, ao saber destes fatos, avisou o pessoal da FAB
de Fortaleza, ordenou ao comandante da Polícia Militar do Ceará que
fizessem uma busca milimétrica da Serra da Aratanha e procedesse ao
recolhimento adequado dos corpos soterrados e dos pedaços que haviam
sido displicentemente deixados até mesmo na superfície, como couro
cabeludo, braços fragmentados, pés esmagados, troncos e outros membros
das vítimas do PP-SRK.
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Pessoas contratadas pela Prefeitura Municipal resgatando corpos
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Nova busca foi marcada e enquanto isso na delegacia municipal, as
pessoas continuavam a levar e procurar por pertences das vítimas.
Parentes chegavam a todo o momento e o delegado fazia a entrega de
materiais mediante um termo improvisado. Ele guardava roupas,
documentos, peças do Boeing levadas até a polícia por pessoas que
voltavam do local da queda e desabafava: "Muita coisa deixou de ser
feita..."
O prefeito da pequena cidade era um
dos mais amargurados com falhas da primeira operação de resgate. Ele
afirmou ter oferecido ajuda para a FAB sem receptividade, dizendo que
"... somente quinta-feira, quando a área foi liberada, fiquei em
condições de tomar uma posição em comum acordo com a delegacia de
polícia, pois era sobejamente sabido que na Serra da Aratanha ficaram
muitos despojos, além do que sobrou do aparelho após a explosão" (SIC).
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Objetos encontrados no avião |
Foram encontradas mais malas,
roupas (algumas contendo pedaços humanos) e até mesmo uma blusa com a
inscrição "Vasp", que estava presa em um galho no local, sem qualquer
marca da tragédia.
Surpreendentemente, uma quantia em dinheiro chegou a
ser encontrada (34 mil cruzeiros e 16 dólares), além de documentos e
uniformes da Vasp e da FAB.
Sob uma palmeira que teve de ser cortada
pelos operários da Prefeitura havia mais corpos quase inteiros, entre
eles o de uma comissária da Vasp.
Passados mais alguns dias, os
destroços do 727-212A prefixo PP-SRK começaram a ser vendidos,
livremente, ao lado da igreja matriz de Pacatuba.
Após o término da
segunda operação de resgate aos mortos e a liberação definitiva da área,
o local começou a ser saqueado indiscriminadamente pelos moradores da
pobre cidade em busca de restos do avião e de objetos que pudessem
vender como ferro-velho, por valores entre 60 e 100 cruzeiros (nossa
moeda na época).
Pessoas de Fortaleza e de dezenas de outros municípios
começaram a viajar até a cidade para comprar uma "lembrança" da
tragédia.
A polícia local tentou, em um primeiro momento, coibir este
macabro comércio mas, após consultar a Vasp e saber que ela não tinha
interesse no material para perícia, liberou a venda.
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Populares vendem destroços do avião |
Depois de um momento de curiosidade
das pessoas, o comércio ficou restrito aos comerciantes apenas, tantas
eram as peças que haviam disponíveis.
Apesar de já se passarem duas
semanas do acidente, meninos e homens subiam diariamente por duas horas
a Serra da Aratanha para trazer peças e continuar a ganhar algum
dinheiro com o que ficou para trás.
Eles reclamavam da dificuldade em
retirar as maiores partes do avião que estavam encravadas no solo, tal
foi a força do impacto do 727 com o solo.
Um pedaço de mais de três
metros de comprimento já havia sido descoberto, mas ainda não havia sido
vendido ou retirado do local em virtude de seu peso, que não foi
suportado por uma equipe de sete homens que tentou trazê-lo para a
cidade.
O jornal Diário do Nordeste, que
era de propriedade de Edson Queiroz (uma das vítimas do acidente),
entrevistou alguns comerciantes sobre esta atividade, ao que eles
disseram não estar fazendo nada de mais, já que a Vasp e a Aeronáutica
não haviam mostrado interesse pelo material, que iria ficar abandonado
na serra.
Um deles, Francisco Feitosa, que
durante a entrevista ao jornal chegou a comprar 200 quilos de destroços
por 60 cruzeiros cada, disse que "... é melhor que (o material) seja
aproveitado, ao invés de ser totalmente destruído com a ação do tempo,
que o lucro de sua compra beneficie os moradores pobres de Pacatuba"
(SIC).
Realmente, os moradores da cidade estavam chocados mas
participavam do comércio por necessidade financeira. O prefeito disse
não poder impedir a atividade em razão da área ser propriedade privada,
fora de seu controle.
Hoje, entretanto, muitos se
arrependem: "Dinheiro de desgraça acaba rápido"... Estas palavras são do
agricultor Moacir de Freitas, que chegou ao local da queda do 727 antes
de qualquer homem do salvamento e diz que "ainda dava para ver que tinha
muita coisa pegando fogo. Não ficou ninguém inteiro".
Ele se lembra que,
quando os bombeiros chegaram, moradores da região já saqueavam os
pertences das vítimas e foram obrigados a largar o que tinham pego.
"A
gente arrodeava a serra pelo outro lado. Muita gente pegou tudo que via
e muitas dessas pessoas que ganharam muito dinheiro com a desgraça
daqueles passageiros já se acabaram" (SIC).
Outro depoimento neste sentido é o
de Luiz da Silva Lopes: "foi uma tristeza ver tanta gente morta... A
gente estava dormindo e ouviu o barulho. Depois, pegou fogo na serra.
Mais tarde as rádios começaram a falar que tinha caído um avião".
Depois
do acidente, ele passou a comprar todo tipo de destroços da aeronave que
os moradores traziam de cima da serra e afirma: "o povo levou muito
ferro-velho e eu comprava de todo mundo. Ia botando tudo aqui em meu
quintal, que é grande, para vender depois" (SIC).
Um dia, ele resolveu
vender todo o ferro-velho de uma só vez e explicou o motivo: "foi depois
que eu vi um dedo de um dos mortos, ainda com um anel de ouro preso.
Aquilo me deu desgosto do tamanho do mundo e parei de comprar o
ferro-velho", relembra.
Segundo Luiz, moradores encontraram até barra de
ouro no local e ele próprio diz ter lavado muita cédula suja de sangue
recolhida no local da queda do PP-SRK.
Trinta dias depois, ainda havia
comércio de partes do 727 mas, agora, em menor escala.
Na delegacia, a
maioria dos pertences das pessoas da região já havia sido devolvida, mas
muitos objetos de passageiros de outras regiões (São Paulo, Rio e Sul do
Brasil), ainda estavam por lá, como livros, agendas e até uma carteira
da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Rio de Janeiro, de um advogado
cuja família não foi até Fortaleza.
Passado um ano, o comércio acabou e
ninguém mais sabia do destino do material, porém ainda havia pertences e
outros materiais na delegacia de Pacatuba, que não tinham sido
procurados por parentes das vítimas. Estavam lá também máquinas
fotográficas, calculadoras e muitas roupas que exalavam o mal-cheiro
característico. O delegado contabilizava, 30 dias após a tragédia, 109
termos de entrega de objetos retirados do local do acidente.
Um túmulo de 14 metros de
comprimento por 6,5 de largura e com 2 de profundidade foi aberto no
Cemitério Parque da Paz, localizado no bairro Castelão e lá foram
enterrados os restos mortais de 126 dos 137 mortos no acidente
(incluindo os que não foram identificados).
No dia do enterro, realizado em 12
de junho de 1982 (quatro dias após a tragédia), cerca de 20 mil pessoas
compareceram à cerimônia fúnebre, presidida pelo cardeal Dom Aloísio
Lorscheider, então arcebispo de Fortaleza. Dom Aloísio também celebrou,
ao lado de 19 padres, uma missa na Catedral Metropolitana em homenagem
aos mortos, cujos caixões foram conduzidos até o local em carros do
Corpo de Bombeiros e, de lá, para o Parque da Paz, deixando o tráfego
nesse roteiro congestionado por mais de duas horas, numa extensão de
três quilômetros em todas as vias de acesso da capital do Ceará.
Durante a missa, que teve a
participação de mais de seis mil pessoas, Dom Aloísio leu também uma
mensagem do papa João Paulo II, enviada via telegrama. Esta é a íntegra
do texto: "Ao tomar conhecimento das trágicas e grandes conseqüências do
desastre aéreo nas proximidades de Fortaleza, pesaroso e compadecido,
elevo preces em sufrágio pelas numerosas vítimas, implorando a
misericórdia divina e o conforto para todos os enlutados, desejando
afirmar-lhes minha presença espiritual, mediante Vossa Eminência, com
sentidas condolências, enviando a todos os atingidos pela dor o penhor,
a consolação e a esperança em Deus. Minha especial benção apostólica".. |