O time de futebol brasileiro da Associação
Chapecoense de Futebol, que tem sede na cidade de Chapecó, no estado de Santa
Catarina, viajava no dia 28 de novembro de 2016 para o jogo de ida da final da
Copa Sul-Americana de 2016 contra o Atlético Nacional, em Medellín, na Colômbia,
que seria realizado dois dias depois.
Ainda no Brasil, a equipe tentou, a
princípio, fazer o voo saindo do aeroporto de Guarulhos direto para Medellín. O
pedido foi indeferido pela ANAC, de acordo com a legislação vigente, com base no
Código Brasileiro de Aeronáutica e na Convenção de Chicago, pelos quais apenas
uma companhia aérea brasileira ou colombiana poderia fazer o voo.
O trajeto foi feito, desse modo, em duas
etapas: um voo comercial pela companhia aérea boliviana BoA, partindo de
Guarulhos às 15h15, no horário de Brasília, e chegando a Santa Cruz de la Sierra,
na Bolívia, três horas depois, e o trecho final realizado em um voo fretado
junto à empresa LaMia.
Um morador de Itanhaém, no litoral de São
Paulo, estava no mesmo voo comercial que levou, na tarde da segunda-feira (28),
a delegação da Chapecoense e os jornalistas do aeroporto de Guarulhos até Santa
Cruz de La Sierra, na Bolívia, onde os todos trocaram de aeronave e pegariam um
voo fretado.
O advogado Marcelo Sanchez, de 31 anos,
seguiu viagem até La Paz para acompanhar o velório da avó paterna. Sentado ao
lado de um locutor de uma rádio de Chapecó, ele descreveu como foi o voo de mais
de três horas ao lado da delegação da Chape: "Eles estavam espalhados no avião e
sempre um vinha brincar com o outro, batia na cabeça fazendo molecagem. Um dos
jogadores que não me lembro o nome estava sentado na poltrona atrás daquela que
eu estava. Ouvi ele comentando que iria jogar, depois voltar para casa, depois
iria para Porto Alegre ver a família."
Já em Santa Cruz de La Sierra, às 20h15
(hora de Brasília) - 18h15 (hora local), a delegação da Chapecoense embarcou na
aeronave Avro RJ85, prefixo CP-2933, operada pela empresa aérea boliviana LaMia.
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Delegação da
Chapeconse antes do embarque - Foto: Facebook/Divulgação |
Segundo reportagem publicada pela revista
Veja, a Chapecoense pagou à empresa LaMia 130 mil dólares pelo voo de Santa Cruz
de la Sierra a Medellín.
Integrariam a comitiva do time o prefeito
de Chapecó, Luciano Buligon, que não embarcou junto com a comitiva; e dois
responsáveis pela logística do clube já se achavam na Colômbia, aguardando a
chegada do voo.
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Jogadores
ajeitam as bagagem antes da decolagem - Foto: Facebook/Rafael_Henzel |
Após a decolagem, segundo relato posterior
do lateral-esquerdo Alan Ruschel, o clima no avião era de descontração no início
da viagem e de muita emoção, pois o time - depois de muito trabalho - conseguiu
se classificar para disputar a final da Copa Sul-Americana.
"Eu estava fazendo mágica com o baralho. Eu
sempre gostei de fazer isso. A gente estava ouvindo pagode. Era um grupo de
pessoas que estava extremamente feliz em fazer história, independente de ser
campeão ou não. A gente estava levando um clube de uma cidade pequena do Brasil
para a final da Copa Sulamericana. Então a gente estava muito feliz" - destacou
Ruschel.
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Foto: Divulgação |
Por volta das 22h, no horário local da
Colômbia, o piloto Miguel Quiroga, que era um dos donos da companhia aérea Lamia,
relatou à torre de controle que o avião apresentava problemas elétricos e
declarou situação de emergência, quando voava entre os municípios de La Unión e
La Ceja.
Os pilotos do voo (Miguel Quiroga e a
copiloto Sisy Arias) que levava a delegação da Chapecoense cogitaram uma escala
para reabastecimento antes de chegar a Medellín, segundo revelaram as conversas
na cabine de comando da aeronave da LaMia.
Os diálogos na cabine de comando da
aeronave, um Avro RJ-85, mostram que comandante e a copiloto falam sobre pousar
em Letícia, na fronteira da Colômbia com o Brasil, e em Bogotá -todos antes de
Medellín. As alternativas foram mencionadas mais de duas horas antes de o avião
cair, na noite de 28 de setembro de 2016.
18h59m07s - Copiloto: "Com quanto tempo
extra chegaremos lá com o combustível?"
18h59m10s - Comandante: "Com 20 minutos
mais. Não, uns 45 minutos mais (...) o bom é que o aeroporto alternativo está
antes [de Medellín]".
Os dois então passam a falar do consumo de
combustível e consideram que, dado o peso do avião e o vento contrário, não
conseguiriam chegar a tempo.
19h37m52s - Comandante: "Está f* a
coisa!"
19h38m24s - Copiloto: "Para Bogotá
estamos a mil quilos [restantes de combustível]".
19h38m27s - Comandante: "Com isso não
vamos [conseguir chegar]. E antes de Bogotá, o que há?"
19h39m06s - Copiloto: "Letícia [cidade
na fronteira com o Brasil]".
A tripulação desiste de Letícia e passa a
considerar Bogotá.
19h46m56s - Comandante: "Vamos ver se
chegando a Bogotá vamos definir se pedimos uma espera [um ponto de espera antes
do aeroporto] ou se pousamos".
Ao falar com o controle de tráfego aéreo, a
tripulação consegue uma rota direta para o aeroporto de Medellín e decide
prosseguir.
19h52m21s - Copiloto: "Mantemos então [a
rota para Medellín]".
19h52m22s - Comandante: "Mantemos".
Os pilotos haviam começado a falar do risco
de o combustível acabar mais de duas horas antes do acidente, de acordo com a
investigação. Alertas sonoros e no painel da cabine apontaram, 40 minutos antes
do acidente, a iminência do problema. Mas a tripulação só informou a falta de
combustível ao controle de tráfego aéreo dez minutos antes de a aeronave cair.
Miguel Quiroga informou a torre de controle
que enfrentava problema de combustível, instantes antes da tragédia.
Segue o diálogo entre o piloto e uma
controladora de tráfego aéreo do aeroporto de Medellín, na Colômbia. Ao longo de
dez minutos, a conversa rotineira, costumeira na aproximação da pista, torna-se
tensa. O piloto da LaMia pede prioridade para pousar e logo depois informa que
já está descendo, por não poder esperar.
Miguel Quiroga, piloto do avião da
Chapecoense: “O voo LaMia CP2933 em aproximação. Solicitamos prioridade para
a aproximação, pois enfrentamos um problema de combustível”.
Yaneth Molina, controladora de tráfego na
torre do aeroporto: “Entendo. Solicita prioridade para sua aterrissagem por
problema de combustível. Correto?”
Avião da Chapecoense: “Afirmativo”.
Torre: “Ok. De acordo. Lhe darei
instruções para efetuar a aproximação. Em aproximadamente sete minutos iniciarei
a confirmação”.
Torre: “Tenho uma aeronave abaixo de
você, efetuando a aproximação, além de sermos afetados por uma revisão de pista.
Quanto tempo tem para permanecer em sua aproximação, LaMia?”
Avião da Chapecoense: “Com emergência de
combustível, senhorita. Por isso lhe peço de uma vez um trajeto final”.
Torre, para outro avião: “Avianca
9356... Inicie a aproximação agora”.
Outro avião: “Iniciando a aproximação
agora”.
Avião da Chapecoense: “Solicito descida
imediata”.
Torre: “LaMia 2933, você pode efetuar um
desvio à direita para iniciar uma descida? Há tráfego 1 milha abaixo de você”.
Avião da Chapecoense: “Solicitamos nos
incorporar de uma vez a outro vetor”.
Torre: “Tem trânsito a sua frente, a
18.000 pés”.
Torre: “Atentos, LaMia 2933. Continue a
aproximação. Pista úmida. Precisa de alguma assistência na pista?”
Avião da Chapecoense: “Lhe confirmaremos
a assistência em pista”.
Avião da Chapecoense: “Senhorita, LaMia
2933 está em falha total, sem combustível”.
Torre: “Está livre e esperando chuva
sobre... Bombeiros estão alertas”.
Avião da Chapecoense: “Vetores, senhora!
Vetores!”.
Torre: “O sinal do radar se perdeu. Não
tenho você. Notifique o rumo agora”.
Avião da Chapecoense: “Rumo 3,6,0. Rumo
3,6,0”.
Torre: "Você está a 8,2 milhas da
pista”.
Avião da Chapecoense: “Jesus!”.
Torre: “Você disse o que agora?”
(Vozes masculinas na torre de controle):
“Não responde”. "Não". "Já caiu. Já caiu".
Torre: “Qual sua altitude agora?”
Fim do contato.
O contato entre a torre de controle e a
tripulação foi perdido às 22h15, entre as cidades de La Ceja e Abejorral. Pouco
depois, o avião caiu ao se aproximar do Aeroporto José Maria Córdova, em
Rionegro, arredores de Medellín, em um monte chamado Cerro El Gordo, de 2.600 m
de altitude.
Em pouco tempo, as autoridades
identificaram o local da queda. Helicópteros foram inicialmente incapazes de
chegar ao local devido à névoa densa na região, e o acesso dos socorristas da
Força Aérea da Colômbia teve que ser por terra.
A princípio, fora divulgado que havia 81
pessoas a bordo; contudo, verificou-se que a contagem inicial incluía quatro
passageiros que deixaram de viajar na última hora.
A comissária de bordo Ximena Suárez,
sobrevivente ao acidente, declarou que, pouco antes da queda, as luzes da
aeronave se apagaram de repente, e então entre quarenta ou cinquenta segundos
depois caiu.
O técnico de voo sobrevivente, Erwin Tumiri,
disse dois dias depois do acidente que somente conseguiu ficar vivo porque
seguiu todos os protocolos para tal ocasião: ficara em posição fetal, com malas
entre as pernas; segundo ele, ocorreu um pânico total no interior da aeronave,
com gritaria e pessoas saindo de seus assentos.
Entretanto, alguns dias depois, Erwin
desmentiu essas informações em entrevista dada à rede de rádio Bluradio de
Bogotá, afirmando que até o exato momento do impacto, nenhum passageiro sabia
que havia uma situação de emergência, sem qualquer aviso da tripulação, e que
todos estavam apenas preparados para a aterrissagem que havia sido anunciada.
Afirmou que tudo foi muito rápido, a sensação de descida, depois as luzes se
apagaram, acendendo-se as de emergência e em seguida o impacto e que não houve
tempo para nada, nem havia ninguém em pânico no momento do impacto.
O ex-goleiro Follmann contou que no momento
da queda, não havia o que ser feito, já que não foi anunciado o problema do
avião e a tripulação começou a se desesperar tentando entender o que estava
acontecendo sem receber respostas. Apegado a sua fé, o atleta contou que, no
momento da queda, pediu a proteção divina.
O aparelho com 77 pessoas a bordo caiu em
Cerro El Gordo, a cerca de 2.600 metros de altura, no município de La Union,
quando estava prestes a aterrissar no aeroporto internacional de Rionegro, que
serve a cidade colombiana de Medellín.
No acidente, 71 pessoas perderam a vida,
incluindo 19 jogadores, 14 membros da comissão técnica e nove diretores do
clube. Apenas seis ocupantes sobreviveram: uma comissária de bordo, um técnico
de aviação, um jornalista e três jogadores.
Edição de texto e imagem Jorge Tadeu da Silva
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Mapas do local do acidente
Representação gráfica das
últimas manobras feitas pela aeronave e a queda. (G1)
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