O avião de Havilland DH-106
Comet 4, prefixo LV-AHR, das Aerolineas Argentinas, conhecido como
“Arco-Íris”, partiu do aeroporto de Ezeiza, em Buenos Aires, às 23 horas
do dia 22 de novembro de 1961, sob o comando de Roberto Môsca, tendo a
seu lado o copiloto Raul Quesada.
Ao chegar a Viracopos, a 1h15min,
portanto, já no dia seguinte, cinco passageiros desembarcaram: Alan
Skellenger, Maria Mila Sole, Manuel Bonino, Maria J. Z. de Bonino e
Victor Ventura.
O LV-AHR foi reabastecido e nessa
madrugada, a do dia 23 de novembro de 1961, às 02h20min, após o embarque
de três passageiros, a aeronave iniciou o taxiamento até a cabeceira da
pista 32 do Aeroporto de Viracopos, em Campinas.
Ocupando o assento da esquerda, o
copiloto, estava no comando da aeronave, enquanto era instruído pelo
piloto, aparentemente, para obter aprendizado no comando desse jato, já
que não possuía nenhuma experiência no comando desse tipo de aeronave.
Após uma longa espera, o Comet
recebeu autorização e decolou às 02h38min, para cumprir a próxima etapa
do voo, a outra escala, desta vez em Port of Spain, capital de Trinidad
e Tobago. A bordo iam 40 passageiros e 12 tripulantes.
Cinqüenta e cinco segundos após a
decolagem, ao atingir os 100 metros de altitude, subindo a 170 nós de
velocidade e ter percorrido cerca de 1900 metros, os motores Rolls-Royce
Avon 524 apresentaram problemas e a aeronave começou a perder altura.
A tripulação tentou corrigir a
altitude, mas perdeu o controle da aeronave, que voando quase que
horizontalmente, mas perdendo gradativamente altura, até atingir um
bosque de eucaliptos, no Sítio da Lagoa, no bairro do Friburgo, situado
a 500 metros da cabeceira da pista de Viracopos.
Com o impacto, o avião abriu uma
clareira de 400 metros de extensão entre as árvores e foi se
despedaçando até bater contra um pequeno morro onde acabou por explodir,
provocando a morte das 52 pessoas que estavam a bordo.
O local, nas imediações do
Cemitério dos Alemães, foi tomado por um grande incêndio provocado pelos
milhares de litros de querosene especial que vazaram dos tanques cheios
do quadrimotor a jato puro. A fogueira era tão intensa que impediu – por
horas - a aproximação dos grupos de socorro.
Destroços e restos humanos
mutilados e carbonizados espalharam-se por toda a clareira e, ainda,
alguns ficaram pendentes em árvores. O maior pedaço intacto da aeronave
foi a carenagem de uma turbina.
Antonio Sigilli, o rádio-operador
de bordo, não teve tempo de enviar qualquer mensagem a Torre de
Controle. A última comunicação havia sido feita pelo comandante, antes
das operações de decolagem.
Wener Schafer, proprietário do
sítio onde o avião caiu, revelou que acordou com a explosão que
antecedeu a queda do aparelho e saiu para o terreiro, ainda atordoado
pelo barulho que lhe parecera que acontecia uma revolução. Sua esposa,
Olga Jurz, declarou: "Julguei que fosse um terremoto. Saí com meu marido
e vimos o avião envolto em chamas. Foi horrível". Schafer não pode se
aproximar das chamas, que eram intensas e envolviam o avião a 500 metros
do ponto em que se encontrava.
O fotógrafo Neldo Cantanti, que
registrou a tragédia para o jornal local Diário do Povo, declarou: “Era
um amontoado de ferro retorcido e a gente pisava na terra queimada.
Ainda chovia muito. Só sobraram a cauda e as turbinas. Não dava para ver
os corpos”, lembrou.
Durante a cobertura, uma história
de muita sorte. Cantanti contou que um dos passageiros perdeu o voo
porque o taxista demorou no trajeto. “O cara queria agredir o motorista.
Ele tinha uma reunião muito importante e iria perder. Minutos depois,
com a notícia da queda do avião, o mesmo cara queria beijar o taxista
que salvou sua vida”, contou.
O lavrador Bertoldo Antônio,
residente nas imediações, viu o aparelho como “uma bola de fogo no ar”,
num espetáculo impressionante, de que jamais esqueceria. “Fiquei
completamente fora de mim” – contou. “Não sabia o que fazer, vendo o céu
iluminado pelas labaredas que saíam do avião e ouvindo os gritos
terríveis dos passageiros. Consegui reunir força e fui até o local, na
esperança de encontrar alguém com vida. Mas só vi destroços do avião,
pedaços de ferro, desprendendo fumaça. Todos estavam carbonizados”.
Durante o trabalho de remoção dos
destroços encontrados na localidade de Friburgo, foram recolhidos restos
de corpos totalmente carbonizados e mutilados, alguns fortemente
abraçados. Duas das vítimas estavam com as mãos entrelaçadas.
por Jorge Tadeu da Silva
Relação das vítimas do
acidente
Tripulantes
Roberto Môsca, piloto; Raul
Mário Quesada, copiloto; Maurício Loubet, copiloto reserva;
Boris Juan Marijanac, navegante; Carlos Leiva, mecânico; Juan
Leira, engenheiro de voo; Antônio Sigilli, operador de rádio;
Washington Garcia, comissário; Ricardo Henrique Garcia,
comissário; Cândida Perez, aeromoça; Lylian Casanovich,
aeromoça; Manuel Vallecillos, navegante reserva.
Passageiros procedentes de
Buenos Aires
Horácio A. Esteverena,
capitão da Marinha Argentina e sua esposa Marta Hortensia
Martoreli; Eduardo Leonidas Vago, Gerente-Geral das Companhias
Marítimas Argentinas; Carlos Francisco Bertoa de Liano, oficial
do Exército argentino; Colette Lousberg de Arlia, belga de 31
anos; Bernardo Fridman, negociante argentino de 57 anos; Ramon
Garcia, argentino 56 anos; Marta L. Smart, estudante argentina
de 17 anos, filha do gerente-geral da Aerolineas Argentinas nos
Estados Unidos, Albert Smart; Mário Antônio Couto, negociante
argentino 40 anos; José Antônio Reyes, eletrotécnico argentino
42 anos; Gilbert Jean Luy, norte americano 47 anos e sua esposa
Luciana Rosa Larreia de Luy, peruana 31 anos; Oscar Manuel Manna,
despachante aduaneiro argentino 26 anos; Salomon Burstzein,
argentino naturalizado 56 anos; David Smith, orador luterano
argentino de 39 anos; Nicolas Susta, arquiteto argentino de 32
anos; José Antônio Talawe, 22 anos oficial do Exército
argentino; Renee Sweig, industrial austríaco 43 anos; Edgar
Bercebal, negociante argentino 30 anos; Ernesto Guilhermo
Serrano, arquiteto argentino 43 anos; Emílio Giancola, sacerdote
argentino naturalizado 31 anos; Maria Gracia Guerrieri de
Barreiro, argentina 58 anos; Maria Rosa Guerrieri, argentina 31
anos; Ricardo Jesus Ezcurra, negociante argentino 46 anos; Oscar
Reinaldo Buhrer, estudante argentino 10 anos; Amanda Maria
Correia de Buhrer, argentina 45 anos; Abraham Wolf Kiszemberg,
argentino naturalizado 37 anos; Francisco Colucci, piloto civil
argentino 31 anos; Alejandro Martin, piloto civil argentino, 33
anos;Jorge Cesar Rodrigues, piloto civil argentino 36 anos;
Francisco Carlos Gabrieli, piloto civil argentino 29 anos,
diretor de aeronáutica da Província de Mendonza; Nicolas Rado,
industrial argentino 35 anos; Clemente Gomez, argentino 31 anos;
William Boryk; Carlos Leonardo Sersosino, argentino 35 anos
funcionário da Aerolineas Argentinas, o único que se dirigia a
Trinidad; C. Z. Omfz; Stig Forum Smitd, ex-chefe de pilotos em
Nova York, que viajava como passageiro.
Clique
AQUI e leia o excelente relato de Etevaldo Amorim sobre a
tragédia.
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Investigações e
consequências
As investigações detalharam
como foi a última parte do voo, quando ocorreu o acidente: no choque
contra o primeiro eucalipto, após ter percorrido 120 metros em
descendente, a aeronave perdeu um trem de pouso.
Aproximadamente 145 metros depois,
o segundo impacto, desta vez contra um eucalipto de proporções maiores,
que resultou em fogo no tanque externo da asa esquerda.
Momentos depois, ocorreu um impacto
contra outro eucalipto, na área do motor nº 1. A aeronave começou a cair
acentuadamente. Devido ao desnível, o Comet tocou o terreno, ao redor de
300 metros após o ponto do impacto inicial. O avião deslizou e
finalmente colidiu com um obstáculo em solo e explodiu.
O acidente foi o primeiro
registrado no Aeroporto Internacional de Viracopos, em Campinas, que
havia sido inaugurado a pouco mais de um ano.
Os prejuízos materiais foram de
mais de 1 bilhão de cruzeiros, cobertos por seguro: o Comet estava
segurado por 1 milhão e 250 mil libras (3 milhões e 500 mil dólares, na
época), principalmente em empresas de seguros aéreos de Londres.
Clique AQUI e leia
a reprodução do Relatório Oficial sobre o acidente
Esse foi o
terceiro acidente envolvendo uma aeronave de Havilland Comet.
A tragédia dos Comet começou inesperadamente em janeiro de
1954, quando um Comet que havia decolado de Roma se
desintegrou enquanto sobrevoava o mar, matando seus trinta e
cinco ocupantes.
Os voos foram suspensos por algum
tempo, mas assim que foram retomados, outra aeronave se despedaçou em
pleno ar, novamente matando todos os ocupantes.
Os navios de salvamento da Marinha
Real Britânica foram enviados ao local do primeiro acidente para
resgatar as peças do avião que estavam submersas, já que o segundo
acidente aconteceu sobre águas profundas, resgatando 2/3 das peças.
Os destroços foram, então, enviados
a Farnborough, Inglaterra onde o Comet acidentado foi cuidadosamente
remontado, utilizando-se peças novas no lugar das que não foram
resgatadas do avião acidentado.
Um outro Comet foi colocado em um
tanque com água, para simular a mesma situação de diferença de pressão
atmosférica e desgaste de material.
Cabe aqui uma explicação: Até então
a maioria dos aviões da época voavam a baixas altitudes, onde a pressão
atmosférica era semelhante à da superfície da terra. Porém os aviões a
jatos necessitam voar a uma altitude muito grande para evitar
turbulências e tempestade, onde a pressão atmosférica é mínima. Como o
ser humano não consegue ficar consciente com uma pressão muito baixa, os
aviões a jato precisam ter um sistema que deixe a pressão dentro do
avião bem maior que a de fora.
Descobriu-se finalmente que os
projetistas não tinham preparado a estrutura para ser usada com essa
diferença de pressão, logo os aviões eram verdadeiras "bombas" voadoras.
Bastou uma rachadura no teto do
primeiro Comet acidentado para que ele se desintegrasse em pleno voo. No
caso do Comet resgatado do fundo do mar, a rachadura havia se iniciado
onde a superfície metálica fora cortada em retângulo, para a instalação
de uma antena de ADF.
Também as janelas dos primeiros
Comet eram quadradas, o que criava pontos de tensão nas extremidades. É
por isso que, a partir dessas tragédias, os aviões passaram a ter
janelas redondas e ovais, com o propósito de diminuir a tensão, e
consequentemente, a fadiga metálica.
E na madrugada de 23 de novembro de
1961, o acidente aqui relatado, com jato Comet 4 de prefixo LV-AHR das
Aerolineas Argentinas, que caiu logo após decolar de Viracopos,
provocando a morte das 52 pessoas que estavam a bordo.
O de Havilland Comet teve uma
carreira muito curta, porém de extrema importância para a aviação
mundial.
Foi um grande sucesso, pois
voava com o dobro da velocidade dos seus concorrentes da época,
porém, com um enorme consumo de combustível, suas rotas eram
curtas.
As tragédias que envolveram
esse modelo de aeronave, serviram de lição para que os outros
projetistas modificassem os seus projetos e fizessem aviões a
jato confiáveis. A era do jato impulsionou a aviação civil
mundial para a sua época de ouro (década de 1960).
Reprodução de jornal da
época
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Reprodução dos jornais: Folha de S.Paulo, Jornal do
Brasil, A Noite, Diário da Noite, Correio do Povo e Última Hora
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Texto e edição de imagens
por Jorge Tadeu da Silva